Pedro acorda com o som do despertador a ecoar. O som penetra
pelos seus sonhos a dentro até que se aperceba que tem de acordar. Levanta-se e
vai directo ao WC para tomar banho e lavar os dentes. É sempre assim o seu
inicio de dia – uma rotina sem fim. Veste-se a correr, come rapidamente e sai
apressadamente de casa. Todos os dias começam da mesma forma e ele já nem se
apercebe disso.
Já fora de casa, corre para
apanhar o autocarro, enquanto carrega o casaco numa mão para não suar
demasiado. Convém chegar em condições ao trabalho e toda a gente sabe que o
suor não é o melhor amigo dos colegas e chefes. Apanha o autocarro, apresenta o
passe e senta-se.
- “Agora sim, vou
poder relaxar um pouco”, diz Pedro, em voz baixa, enquanto observa as ruas de
Lisboa, pela janela do autocarro.
De repente ouve-se um estrondo
alucinante e sente-se o autocarro a virar ao contrário. O autocarro colidiu com
um carro, numa estrada muito inclinada, e vinham os dois a mais de 100km/h. O
motorista saiu disparado pelo vidro da frente e os passageiros voaram dentro do
autocarro nas mais diversas direcções e distâncias. Ouvem-se gritos desesperan
tes
mas o silêncio de muitos é o que mais assusta.
Pedro foi disparado contra um
banco muito à frente e, quando despertou, olhou para as suas mãos e só via
sangue. Olhou em redor e viu o caos que nunca imaginara ver, nem num filme
dramático ou de terror. Lembrou-se, por momentos, que não tinha como avisar que
chegaria atrasado ao trabalho mas, de repente, fez-se luz na sua mente e deu um
grito ensurdecedor. Pedro apercebera-se que tinha estado a desperdiçar a sua
vida numa rotina e que tinha posto de lado a sua vida pessoal em prol da
carreira. Apercebeu-se que não vivia há muitos anos. E se agora tudo chegasse
ao fim? E se esta ida para o trabalho fosse o seu grande final?
– “ Se me safar desta, vou mudar a minha vida
e vou voltar a viver. Vou ressuscitar do mundo dos mortos-vivos porque morto já
eu estava. Só espero safar-me, só espero mesmo”, disse Pedro até que os seus
olhos se voltaram a fechar.